A calendula é uma planta de cuja flor se extraem princípios activos cicatrizantes, o mesmo é dizer regenerativos de tecidos vivos.
Não nos ocorre colhermos flores de calendula para, com elas, fazermos linimentos ou cataplasmas de efeitos terapêuticos.
Isso é coisa de pobrezinhos, de gente rústica, mística...em suma: pouco evoluída e civilizada.
Claro que a maioria de nós costuma procurar nas farmácias ou, modernamente, nas para-farmácias o creme, ou loção, que surta o efeito pretendido.
Enquanto isso a calendula revela-se aos nossos olhos nos locais mais inóspitos.
Estas têm vindo a florir entre a aresta do lancil do passeio e o asfalto, mesmo junto a uma sarjeta.
O local onde nasce, cresce e floresce não lhe diminui a beleza e propriedades.
Há tanta similitude entre uma planta, e suas flores, e cada um de nós, e o que revelamos, ao longo das nossas vidas!
Quem duvida da fragilidade humana face às intempéries que a vida lhe vai reservando?
Também a nós é passível de se nos acometerem geadas e inundações que nos devastam e mudam o rumo inicialmente idealizado.
Também temos capacidades que podem ser reveladas e transformadas em processos de auto-ajuda, ou de ajuda aos outros.
As cores da corola da calendula, ou dos nossos olhos, não passam de cores e, eventualmente, de formas.
E a essência? O óleo da planta, que trata? A nossa alma, que cura?
Nem tudo se compra.
No que diz respeito à alma, a compra velada, ou explícita, não traz harmonia duradoura.
Abomino a expressão "não há almoços grátis", como se em cada acção haja sempre uma moeda de troca implícita.
Talvez o retorno seja muito mais elaborado e todas as nossas acções não passem da necessidade de honrarmos quem nos educou para a generosidade.
A honra é, cada vez mais, um conceito arredado de alguns quotidianos.
Vou continuar, muito provavelmente, a ser assim: divagante nas observações que faço; ainda que hajam vozes dissonantes que se remexem com o que digo e escrevo.
São vozes que me dizem querer bem, mas que me fazem sentir mal.
Por inveja? Por incapacidade de me entenderem? Por terem necessidade de estruturarem os outros, na impossibilidade de o terem feito a si próprios?
Demasiadas perguntas para uma tarde de um domingo cheio de sol.
Enquanto isso, vou guardando na memória do cartão (e na minha) estas flores que espero rever amanhã, no percurso que farei e que, felizmente, me tem afastado da aridez de algumas vozes.
AnaPaulaFerreira
Foto: Calendula, em Lisboa, 20 de Fevereiro de 2014, num dos meus percursos diários.